Teatro Amazonas por Simone Momente
A Floresta no Palco
Para entender a obra de Simone Momente sobre o Teatro Amazonas, é preciso primeiro compreender que a artista não retrata lugares; ela costura memórias. Em sua jornada criativa, ícones da arquitetura como o Copan e a Torre Eiffel se tornaram pretextos para explorar a passagem do tempo e o afeto. Mas com a Amazônia, o chamado foi diferente. Era o eco de um sonho antigo, nutrido por um fascínio pela natureza que lhe foi transmitido ainda na infância. Era seu pai, recitando Gonçalves Dias – "Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá" – que plantou a semente de uma conexão que, agora, floresce em arte.



Esta obra, portanto, nasce de uma confluência entre a memória pessoal e o imaginário coletivo. Na visão de Simone, o Teatro Amazonas transcende a arquitetura para se tornar uma personagem com “voz própria, presença e olhar”. Não é um edifício que ela pinta, mas uma entidade que ela interpreta. Através de sua linguagem de colagens, que sobrepõe camadas de papel e aquarela, ela nos apresenta um guardião que se emociona, ri e zela pela interação dos povos. O palco se converte em um portal, e a opulência europeia do edifício é abraçada, quase rendida, pela força ancestral que o rodeia.
Na composição, o teatro é envolvido por ondas e folhas, como se a própria floresta o reivindicasse para si, desenhando um novo pacto entre cultura e território. A paleta não é decorativa: ela narra mitos. Os tons de vermelho e verde invocam o Curupira, a forma da Vitória-Régia evoca a lenda de Naiá, e as cores úmidas pulsam com a vida do rio que atravessa corpos e tempos. Simone não ilustra; ela convoca fragmentos de histórias ancestrais que resistem ao esquecimento.
O silêncio em sua obra não é ausência, mas densidade. É o som do que só se percebe no recolhimento, um eco das próprias raízes. Nesse processo criativo, a artista confessa ter sido atravessada pela energia da floresta como quem sente um rio percorrer o corpo — em ondas, em curva, em fluxo. Sua arte, profundamente intuitiva, nos convida a sentir com o mesmo respeito com que se pisa a mata.
Assim, sua criação sobre o Teatro Amazonas se revela como uma arca de memórias que navega no agora. É um manifesto visual que nos convida a olhar principalmente para dentro, pois, como afirma a artista, “você só consegue mudar o mundo se você mudar internamente primeiro”. A imponência da cena nos faz sentir pequenos para, então, compreendermos a grandeza de nosso papel no universo de coexistir. Mais do que uma homenagem, a obra é um portal. Um lugar onde o concreto se curva diante das lendas, e onde a arte, nas mãos de Simone Momente, floresce com a alma da floresta: livre, diversa, imponente e eterna.




