Quando o Vento Sussurra, Ele Pinta

Mario Schuster

“Nasci desenhando”. Com essa simplicidade quase elementar, Mario Schuster se define, ancorando sua existência à arte desde a origem, em Pelotas, no extremo sul do Brasil. Sua trajetória é um testemunho dessa ligação visceral: autodidata precoce, aos doze anos já absorvia a mestria no ateliê do uruguaio Nestor Rodrigues, antes mesmo que os caminhos o levassem à universidade – primeiro, singularmente, para a Medicina Veterinária, depois, como um retorno ao essencial, para as Artes Plásticas, com bacharelado em Pintura.
Essa dupla formação talvez explique a profundidade do seu olhar, capaz de aliar a observação minuciosa à empatia radical pelo mundo natural. Em suas telas, a natureza não é paisagem, mas presença íntima, fragmentária: troncos de árvores revelando microcosmos, a delicadeza improvável de uma pena encontrada ao acaso, ninhos desfeitos pelo vento, a fragilidade translúcida das asas de uma borboleta, galhos que são pura coreografia aérea. Mario resgata essas “banalidades cotidianas” do fluxo apressado do olhar contemporâneo, oferecendo-as como pausas, como portais para a contemplação e para a redescoberta da beleza contida no detalhe.
Cada pintura é uma pausa, uma suspensão do tempo, um convite à lentidão. São imagens que não gritam — sussurram. E nesse sussurro, revelam um mundo íntimo, quase secreto, onde tudo tem sentido.
Mas seu silêncio pictórico não é alheio ao ruído do mundo. Atento às dissonâncias sociais, Mario aborda a violência urbana, as cicatrizes das guerras, o racismo velado, a desigualdade persistente. Sua arte, contudo, recusa o panfleto. A crítica emerge sutilmente, através de símbolos e atmosferas carregadas de sentimento, questionando o espectador de forma oblíqua, convidando à reflexão em vez da reação imediata. A série "Marias", ecoando a força resiliente da canção de Milton Nascimento, e as mulheres tatuadas, que parecem incorporar a sede de infinito da frase de Clarice Lispector ("Liberdade é pouco para o que eu quero"), são exemplos dessa abordagem potente e delicada.
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Ainda que retrate o humano, suas figuras não são hiper-realistas. Elas mantêm o mistério da matéria. Pinceladas que respiram, camadas que se revelam aos poucos, atmosferas suspensas entre o visível e o sensível. O que ele pinta não são apenas imagens — são estados de espírito. São janelas para dentro.
Mario Schuster faz da arte um ato de resistência. Contra o mundo acelerado, oferece contemplação. Contra o excesso de ruído, entrega silêncio. Contra a indiferença, propõe o afeto do olhar atento. E assim, em cada obra, ele nos devolve algo que andava faltando: a capacidade de ver, de sentir e de, quem sabe, transformar.
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