Arte que escuta o sussurro da Amazônia
Regina Picoli
Seu primeiro impulso criativo diante da Amazônia não foi um desenho nem uma fotografia, mas uma sensação. O verde profundo, os sons vivos das águas, o chamado dos pássaros e animais — tudo isso a envolveu em reverência. Era como se a arte já estivesse ali, pronta, apenas esperando para ser revelada em cores e histórias.


Regina traduz esse território com um olhar realista que vai além da precisão: ele respira emoção. Sua paleta não imita a natureza, mas a sente. Ao optar por uma gama limitada de cores, extrai delas nuances escondidas, luzes oblíquas, texturas que narram, sem palavras, a complexidade vibrante da floresta. Cada folha, cada reflexo d’água, cada olhar animal, é tratado como um segredo revelado.
Mas talvez seja no olhar dos animais que sua arte alcance sua expressão mais sensível. É ali, nas pupilas do mico-leão-dourado — símbolo pessoal que escolheu para representar a Amazônia — que ela descobre a ponte entre o detalhe técnico e a alma do bioma. Com sua exuberância dourada e delicadeza rara, o animal aparece em suas telas não só como espécie ameaçada, mas como metáfora da própria arte: um ser frágil e valente, que carrega consigo luz, silêncio e legado.
Esse silêncio, aliás, é parte vital do processo criativo da artista. Não como ausência de som, mas como escuta ativa. No ateliê, entre pinceladas calmas e atmosferas suspensas, Regina cria um espaço que se afasta do ruído externo para estabelecer, com a floresta, uma conversa de igual para igual. Uma sinfonia entre o sussurro da selva e o silêncio da criação.
A geometria da floresta, para ela, não reside em fórmulas exatas, mas no entrelaçar das nervuras, na dança dos galhos, nos labirintos de água. É uma ordem que aceita o caos. Uma beleza que se esconde no que é imperfeito, assimétrico, orgânico. E é justamente esse tipo de ordem selvagem que seu olhar treinado captura com rara sensibilidade.
Enquanto pintava a Amazônia, Regina descobriu uma floresta dentro de si. E talvez seja essa a maior lição de sua obra: "Aprendi que dentro de mim também existe uma floresta: intensa, profunda e cheia de contrastes." E é essa honestidade que reverbera em suas telas. Elas nos fazem uma pergunta silenciosa e poderosa: estamos prontos para ver o mundo com a mesma atenção, com o mesmo respeito? O realismo de Regina Picoli, em sua expressão mais madura, nos lembra que o ato mais radical de preservação começa com um ato de verdadeira observação.

