Entalhar a Vida com Arte

Iuri Lima

Na madeira marcada pelo tempo, Iuri Lima escreve sua história. Uma história que começou no bairro de Itacaranha, em Salvador (BA), entre o som das ondas da Baía de Todos-os-Santos e o eco das mãos de seu pai — um artista plástico que entalhava sonhos em gravuras de madeira. Foi ali, entre os cheiros de tinta e serragem, que Iuri, ainda menino, encontrou seu destino. Aos 8 anos, quando o pai saía para o trabalho, ele já tentava imitá-lo, com mãos pequenas e curiosidade imensa. Aos 11, passou a ajudá-lo nos entalhes e pinturas. E quando a doença o enfraqueceu e a arte se tornou impossível para ele, foi o filho quem assumiu o gesto. A madeira, agora, era dele.
Com a morte precoce do pai, Iuri não herdou apenas o ofício, mas uma missão. Durante anos, dividiu-se entre dois caminhos: o das artes e o do futebol. Dos 19 aos 25 anos, foi jogador profissional. Mas ao perceber que não seria nos campos que encontraria sua verdade, retornou às raízes. A arte, como uma voz que nunca se calou, o chamou de volta. Sua primeira exposição foi em 2013, na Câmara Municipal de Salvador. Um reencontro com sua origem, agora como artista por direito e merecimento.
Dois anos depois, em 2015, a vida lhe apresentou um novo cenário: Lisboa. Foi levado até lá pelas mãos de um amigo de infância, e acolhido pelo Café Gandalata, que apoiou seu recomeço artístico. Entre mesas e tintas, reconstruiu sua trajetória com humildade, talento e persistência. Sua arte ganhou novos públicos, novas paisagens — e novos palcos: o Hotel NH, a Galeria Sá da Costa e a Galeria Onofre, em Portugal; o Carrousel du Louvre, em Paris; a Espacio Gallery e a Embaixada do Brasil, em Londres. Em uma dessas exposições, realizou uma performance artística ao vivo, criando uma obra diante do público, que hoje pertence ao acervo permanente do Museu do Terremoto, em Lisboa.
Mas o que torna a obra de Iuri única vai além das exposições. Está na técnica que desenvolveu com as próprias mãos, no silêncio da madeira. Ele trabalha com xilogravura contemporânea em baixo relevo, utilizando madeira compensada de 4mm. O desenho nasce do entalhe, da retirada, da subtração. Depois vem a cor — aplicada com pincel e, sobretudo, com os dedos. É no toque, na sensibilidade tátil, que ele encontra o tom exato. Seu processo é quase um ritual: ele sente a madeira, escuta seu ritmo, deixa que a imagem emerja com intensidade e delicadeza.
A arte de Iuri Lima é visceral, ancestral e moderna ao mesmo tempo. Carrega as marcas de sua herança afro-brasileira, o legado do pai, a sabedoria do corpo e da memória. Suas obras têm textura, alma e presença. São imagens que falam da resistência e da beleza, da dor e da reconstrução. Ele entalha não só a madeira — entalha também o tempo, a ausência, a vida.
Hoje, com obras circulando entre continentes, Iuri segue entalhando sua identidade no mundo. Cada peça sua é um gesto de cura, de permanência, de arte como ato de amor e continuidade. Ele não apenas cria — ele transforma. E ao olhar para suas obras, somos também convidados a tocar nossa própria história.
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Instagram: @iuridesouzalima
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